sábado, novembro 17, 2007

Outono (Elegia ao declínio suave)

Pequenas palavras rasuram as gretas dos lábios pálidos, arroxeados da solidão que gela as árvores, os prédios e o Sol que se levanta sobre a manhã e os pássaros entorpecidos.
A brisa sangra por entre o fumo dos escapes e a névoa que serpenteia por entre as labaredas do lume tépido, libertando o odor reconfortante de castanhas sacrificadas nas cinzas como as folhas que se desfazem na berma dos passeios vergastados.

Tudo se cobre pelo véu do Outono moribundo, últimos estertores delirantes de uma estação condenada.

E o delírio é a calma.

Como se se abrisse uma espiral escavada até ao núcleo da Terra, se este não fosse uma amálgama ardente e viscosa mas um buraco negro, um vórtice que sugasse todo, completamente todo o equilíbrio dinâmico, energético e a animação existente à face rasgada no passeio dos Elementos.
Tudo cai naquele silêncio, no declínio suave e implacável que congela nas veias e condensa nas janelas, escorrendo em fieira das goteiras apodrecidas.

E também a fúria intempestiva.

Porque há vezes em que essa força jorra, brotando bruscamente da matriz fervente sobre a cidade em convulsões exasperadas:
Dilúvios de vento e neve, erupções que se espalham em ondas de choque e piroclastos e lava que batem e rebatem no espelho de nuvens, sonhos perdidos entre tornados e marés.

No entanto, qualquer seja a vida, qualquer que seja o espírito que toma conta da cidade, o prazer que corre pelas veias e formiga o corpo é o da recordação de um outro Outono, de uma outra calma entrecortada pela violência de desejos irreprimíveis